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Nigéria: Corrupção e mau uso roubam direitos dos nigerianos

Governos locais do estado de Rivers desperdiçam as receitas do petróleo em vez de financiar a saúde e a educação

(Lagos, 31 de janeiro de 2007) – Oficiais do governo local do mais rico estado produtor de petróleo da Nigéria têm desperdiçado as crescentes receitas que poderiam fornecer serviços básicos de saúde e educação para algumas das pessoas mais pobres da Nigéria, disse a Human Rights Watch num relatório lançado hoje. A Human Rights Watch descobriu que a falha do governo em lidar com a corrupção ao nível local viola a obrigação da Nigéria de fornecer serviços básicos de saúde e educação a seus cidadãos.

O relatório de 107 páginas, “'Chop Fine': The Human Rights Impact of Local Government Corruption and Mismanagement in Rivers State, Nigeria” (Caixa dois: O impacto da corrupção e má gestão governamental local sobre direitos humanos no estado de Rivers, na Nigéria), detalha o mau uso de fundos públicos por oficiais locais no centro geográfico da crescente indústria do petróleo da Nigéria e os efeitos nocivos para a educação primária e serviços básicos de saúde. O relatório é baseado em dezenas de entrevistas feitas no estado de Rivers com oficiais do governo e de agências doadoras, servidores públicos, trabalhadores da área de saúde básica, professores, grupos da sociedade civil e residentes locais. A Human Rights Watch também analisou os orçamentos dos governos estadual e local.

“Vários oficiais locais e do estado em Rivers têm desperdiçado ou roubado dinheiro público que poderia ter sido investido no fornecimento de serviços vitais de saúde e educação”, disse Peter Takirambudde, diretor da divisão da África da Human Rights Watch. “Orçamentos local e estadual têm expandido dramaticamente nos últimos anos, mas a má gestão e o roubo deixaram os serviços básicos de saúde e educação em um estado terrível de deterioração”.

A Human Rights Watch apelou a todos os níveis de governo na Nigéria a aprovar, sem demora, reformas que façam com que governos locais e estaduais sejam mais transparentes e responsáveis perante o público. As reformas devem garantir a independência de instituições anticorrupção e dar-lhes os recursos necessários para lidar com a epidemia de corrupção ao nível local no estado de Rivers e em qualquer outro lugar. É vital que o governo em todos os níveis publique e dissemine informações detalhadas e exatas sobre o seu uso de recursos públicos.

Desde 1999, as receitas para os 23 governos locais em Rivers mais do que quadruplicaram. E em 2006, o orçamento do governo do estado de Rivers foi de US$ 1,3 bilhões, maior do que os orçamentos de vários países do oeste da África. Mas os bons ventos não foram traduzidos em esforços por parte de governos locais para fortalecer sistemas básicos de educação e serviços de saúde, que há vários anos se encontram à beira de um colapso.

O governo federal da Nigéria, guiado em parte pela constituição do país, delegou a maioria das responsabilidades de fornecer serviços básicos de saúde e educação aos 774 governos locais. De acordo com a lei internacional, a Nigéria é obrigada a garantir os direitos fundamentais dos nigerianos à saúde e à educação, de maneira progressiva e utilizando o máximo de seus recursos disponíveis. Enquanto os governos federal e estaduais criam políticas e oferecem outras formas de apoio, as administrações de governos locais são responsáveis pela garantia diária de que os serviços sejam fornecidos. Vários governos locais em Rivers ignoram completamente essas responsabilidades.

O relatório documenta como o fluxo de receitas nos tesouros dos governos locais nos últimos anos tem sido totalmente mal alocado ou roubado imediatamente. Vários governos locais têm desperdiçado fundos em novos prédios governamentais e outros grandes projetos de construção, o que diminui os gastos com serviços de saúde e educação. Um governo local dedicou somente 2,4 por cento de suas receitas para a manutenção de sua infraestrutura de escolas primárias, que já se encontram em pedaços, enquanto gasta 30 por cento de seu orçamento com salários e despesas dos escritórios do presidente administrativo e dos conselheiros legislativos. Alguns presidentes administrativos de governos locais têm alocado mais dinheiro para suas próprias viagens e “despesas variadas” do que para escolas e clínicas de saúde aos quais cabem gerenciar.

Como um residente amargurado colocou: “Tudo o que eles fazem é construir as suas sedes e coisas enormes, colocam ar condicionado nelas e compram veículos para dirigir por aí.”

Receitas significativas também são perdidas para o que aparenta ser roubo. Um presidente administrativo de governo local gastou grandes somas em uma série de projetos não existentes, incluindo um “viveiro de peixes de demonstração” sem água nem peixes e uma “academia de futebol” que nunca chegou a ser construída. Outro alocou fundos do orçamento local para pagar mais de 100 “comitês funcionais/ oficiais de protocolo” cujas responsabilidades, se existiam, eram totalmente incertas; o total de seus salários excedia aquele de todos os empregados do setor de saúde local do governo. Um inquérito judicial mostrou que um presidente administrativo de governo local concedeu ilegalmente contratos lucrativos de manutenção e outros tipos de serviços a si mesmo, e em alguns casos ele falhou em providenciar tais serviços.

Servidores públicos, trabalhadores da área de saúde e outras pessoas disseram à Human Rights Watch que o dinheiro do orçamento do governo local alocado para os serviços de saúde e educação nunca chegaram ao destino pretendido. Os salários de vários trabalhadores da área de saúde estão atrasados há meses, apesar de o dinheiro para pagá-los estar incluído no orçamento. O diretor de uma escola primária disse à Human Rights Watch que quando ele reclamou com oficiais locais sobre a falta de material em sua escola, como giz por exemplo, recebeu a resposta de que o governo local não tinha dinheiro para a educação. A Human Rights Watch visitou clínicas tão mal equipadas que seus funcionários desmoralizados quase não podiam oferecer serviços, e em alguns casos os funcionários colocaram cadeados nas portas e abandonaram seus postos, todos de uma só vez. Várias escolas primárias no estado de Rivers não têm carteiras, livros ou outros materiais de ensino, e as aulas são dadas em prédios caindo aos pedaços, sem água ou banheiros.

“Começamos a produzir petróleo por aqui em 1957, mas veja a cidade - o governo não faz nada por nós”, disse à Human Rights Watch um professor entrevistado no governo local de Akuku/Toru. “O governo local supostamente deveria ajudar as escolas, mas eles não o fazem. Eles não nos dão nenhum apoio... As coisas mais importantes que precisamos são livros, materiais para a instrução e um banheiro.”

O governo do estado de Rivers é acusado de ser negligente com a conduta dos seus governos locais. Mas vários problemas de governança em nível local no estado são reflexo da própria conduta do governo do estado. Por exemplo, o escritório do governador do estado teve um orçamento para viagens de quase US$ 65.000 por dia em 2006, somados a orçamentos de “concessões”, “contribuições” e “doações” não especificadas, que totalizaram US$ 92.000 adicionais por dia. Essa extravagância oficial contrasta nitidamente com a ausência virtual dos serviços do estado para grande parte da população.

“A corrupção do governo local em Rivers é absurdamente descarada e tem causado um sofrimento incalculável”, disse Takirambudde. “Apesar disso, nem o estado de Rivers nem o governo federal tem feito o mínimo necessário para tratar do problema da corrupção local ou para punir os responsáveis.”

Críticas públicas sobre o abuso do estado no uso de recursos públicos são difíceis de serem feitas, pois o governo do estado de Rivers se recusa a publicar seu orçamento e oculta do público informações básicas sobre os gastos do governo do estado. Alguns jornalistas e atores da sociedade civil que criticaram publicamente as ações do governo do estado sofrem ameaças, intimidação e mesmo violência pelas mãos dos serviços de segurança do governo e de capangas ligados aos políticos de Rivers.

O impacto humano da falha do governo em cumprir com suas responsabilidades de fornecer serviços básicos de saúde e educação não é limitado ao estado de Rivers. Uma em cada cinco crianças nigerianas morre antes da idade de 5 anos, uma estatística que se traduz em mais de 1 milhão de mortes de crianças por ano. Muitas são perdidas para doenças que poderiam ser facilmente prevenidas pela infraestrutura de saúde básica que os governos locais da Nigéria têm a obrigação de manter. Escolas públicas primárias, parte de um sistema escolar que um dia esteve entre os melhores da África, se encontram em um estado assustador de falta de reparos e mal funcionamento em boa parte da Nigéria.

Desde o fim do governo militar em 1999, o governo do Presidente Olusegun Obasanjo tem promovido o que chama de “guerra contra a corrupção”. Enquanto o governo federal da Nigéria faz alguns esforços para combater a corrupção e melhorar a transparência de suas próprias finanças, ele falha em tratar do problema da corrupção excessiva nos níveis locais e estaduais. Esforços anticorrupção são impedidos pela falha do governo em reformar um sistema político que freqüentemente recompensa políticos que usam corrupção e violência para subverter o processo democrático, especialmente nos níveis local e estadual.

No estado de Rivers, vários políticos locais e estaduais atuais chegaram ao poder por meio de eleições fraudulentas e sangrentas, mesmo em relação aos padrões terríveis das eleições no país em 2003 e 2004.

“A Nigéria não verá estes problemas acabarem completamente a menos que o governo trate das causas fundamentais que se encontram no coração do sistema político”, disse Takirambudde. “O governo nigeriano deve garantir que políticos corruptos e abusivos não sejam capazes de manipular as eleições de abril e colocarem-se em posições de poder político”.

Estados estrangeiros devem incitar o governo nigeriano a pressionar por maior transparência e responsabilidade nos governos local e estadual, disse a Human Rights Watch. Os governos devem ser mais assertivos em prevenir que oficiais corruptos escondam os produtos da corrupção em bancos no exterior.

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