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Afeganistão: Civis pagam o preço por ataques insurgentes intensificados

Aumento do número de civis mortos indica crimes de guerra pelo Talibã e Hezb-e Islami

(Cabul) – Mortes de civis causadas por ataques insurgentes no Afeganistão aumentaram dramaticamente nos últimos 15 meses, e muitas foram o resultado do fracasso dos insurgentes em respeitar as leis de guerra, disse a Human Rights Watch em um relatório divulgado hoje.

O relatório de 116 páginas, The Human Cost: The Consequences of Insurgent Attacks in Afghanistan (O custo humano: As conseqüências de ataques insurgentes no Afeganistão), descreve como grupos insurgentes afegãos, principalmente as forças do Talibã e do grupo Hezb-e Islami, intensificaram dramaticamente atentados e outros ataques em 2006 e no começo de 2007. O relatório baseia-se em dezenas de entrevistas com civis vítimas de ataques e com suas famílias, assim como em uma análise detalhada de documentos e registros disponíveis.

“Atentados suicidas e outros ataques insurgentes têm se intensificado dramaticamente desde 2005, com quase 700 civis mortos no ano passado nas mãos do Talibã e de grupos semelhantes”, disse Joanne Mariner, diretora de terrorismo e contraterrorismo da Human Rights Watch. “Os insurgentes estão cometendo cada vez mais crimes de guerra, muitas vezes tendo civis como alvo direto. Mesmo quando têm alvos militares, os ataques insurgentes são tão indiscriminados que civis do Afeganistão acabam sendo as principais vítimas.”

O relatório documenta como forças insurgentes continuam a ter civis como alvo de ataques, violando assim as leis de guerra. O relatório também mostra como até os ataques dirigidos a forças militares internacionais e afegãs têm sido feitos sem o devido respeito às vidas de civis.

A Human Rights Watch já documentou vários casos em que o governo afegão e as forças internacionais no Afeganistão realizaram ataques aparentemente indiscriminados, violando as leis de guerra.

Este relatório explica que 2006 foi o ano em que mais morreram civis no Afeganistão desde 2001. No todo, pelo menos 669 civis afegãos foram mortos em pelo menos 350 ataques armados, a maioria aparentando ter sido dirigida intencionalmente a civis ou a alvos civis. Outros 52 civis foram mortos em ataques insurgentes nos dois primeiros meses de 2007.

Cada vez mais, o Talibã tem como alvo grupos de civis específicos, inclusive trabalhadores de ajuda humanitária, jornalistas, médicos, líderes religiosos e empregados civis do governo, acusando a todos de espiões ou colaboradores do governo. Em 2006, pelo menos 177 civis foram mortos em assassinatos, e emboscadas e ataques similares continuam em 2007. Um exemplo recente e horroroso foi a execução sumária pelo Talibã do jornalista afegão Ajmal Naqshbandi e seu motorista, Sayed Agha, violando assim leis da guerra.

“Os assassinatos do jornalista afegão Ajmal Naqshbandi e de seu motorista Sayed Agha pelo Talibã foram crimes de guerra”, disse Mariner.

O relatório contém vários relatos de vítimas civis afegãs e de seus parentes, falando sobre os ataques insurgentes e suas conseqüências. Por exemplo, Sherzad (nome fictício), uma criança de nove anos que foi gravemente ferida em um ataque suicida na capital Cabul em março de 2006, contou à Human Rights Watch como metralha perfurou seu estômago, derramando seus intestinos. “Às vezes eu sonho com aquele dia – eu tenho pesadelos”, Sherzad disse. “Eu achei que eu não sobreviveria. Eu comecei a recitar a kamilah [a prece dos mártires] quando eu fui ferida naquele dia, porque eu achei que eu ia morrer.”

O relatório descreve como os insurgentes têm regularmente realizado atentados e ataques suicidas a alvos militares em áreas altamente povoadas, matando combatentes e civis sem distinção ou causando dano excessivo a civis, de maneira desproporcional se comparado às vantagens militares esperadas. Muitos afegãos disseram à Human Rights Watch que eles não podiam compreender por que as forças insurgentes escolhiam atacar áreas civis.

Um homem, que foi queimado em um atentado a bomba em julho de 2006 perto do Ministério da Justiça em Cabul, disse à Human Rights Watch: “Eu não vi nenhum pessoal da ISAF (forças internacionais) naquele dia perto do ministério, eu vi somente o meu povo, o povo afegão. O que foi o alvo, o povo?”

O relatório documenta como os ataques insurgentes estão afetando cada vez mais a população civil fora do sul e do sudeste do Afeganistão, a base tradicional do Talibã. Em 2006, aproximadamente um terço dos ataques a bomba fatais registrados, muitos dos quais causaram várias mortes entre civis, aconteceram em outras áreas, inclusive em Cabul, na cidade de Mazar-e Sharif, ao norte do país, e na cidade de Herat, a oeste.

Os atentados a bomba em 2006 mais do que dobraram em comparação a 2005. A Human Rights Watch contou quase 200 ataques a bomba em 2006, que mataram cerca de 500 civis. Muitos atentados foram ilegais sob a lei humanitária internacional. Os insurgentes intencionalmente tinham como alvo objetos civis que não tinham nenhuma função militar, inclusive escolas, ônibus, ou bazares; eles também exerceram vários atentados a bomba que mataram combatentes e civis sem distinção ou causaram excessivas mortes de civis em relação às vantagens militares esperadas; e também utilizaram ataques cuja finalidade principal parece ter sido aterrorizar a população civil. Todos estes métodos são ilegais sob as leis de guerra.

Ataques suicidas insurgentes têm sido especialmente fatais para civis. Em 2006 houve pelo menos 136 atentados suicidas no Afeganistão, seis vezes mais do que em 2005. Desses, pelo menos 112 ataques – a maioria – foram contra alvos militares, porém a maioria dos ataques mataram mais civis do que combatentes: aproximadamente 20 outros ataques foram intencionalmente dirigidos contra civis. Ataques suicidas insurgentes em 2006 mataram pelo menos 272 civis afegãos e 37 representantes de forças governamentais ou internacionais: os ataques suicidas mataram oito vezes mais civis do que combatentes.

Enquanto ataques suicidas não são inerentemente ilegais sob as leis de guerra, os ataques exercidos no Afeganistão freqüentemente foram. A Human Rights Watch descobriu que, com freqüência, os homens-bomba falharam em dirigir com precisão seus ataques a alvos militares, e geralmente detonaram explosivos de maneira que pudessem causar mortes excessivas ou indiscriminadas de civis. Além disso, esses homens-bomba quase sempre se disfarçaram de civis, violando proibições legais contra “perfídia” que são destinadas a manter a distinção entre civis e combatentes em tempos de guerra. Os ataques pérfidos são ainda mais perigosos para civis: vários civis afegãos foram baleados equivocadamente por forças internacionais e do governo afegão que erroneamente acreditavam que eles eram homens-bomba.

O novo relatório também detalha como os ataques contra professores e escolas afegãs, especialmente as escolas para meninas, dobraram em comparação ao já elevado nível de 2005. Os ataques contínuos têm deslocado centenas de milhares de estudantes das salas de aula. O Talibã e outras forças insurgentes têm escolas como alvo por razões ideológicas, alegando que elas são contra a fé islâmica, ou porque em áreas rurais muitas vezes as escolas são os únicos símbolos do governo.

A Human Rights Watch observou que as operações militares do governo afegão e das forças internacionais também causaram muitas mortes entre civis. Pelo menos 230 civis foram mortos durante operações da força de coalizão ou da OTAN em 2006, algumas das quais parecem ter violado as leis de guerra. Não há evidência que as forças de coalizão intencionalmente têm civis como alvo, mas em vários casos as forças internacionais conduziram ataques indiscriminados ou deixaram de tomar precauções adequadas para evitar danos a civis. A Human Rights Watch reportou muitos desses casos.

A Human Rights Watch disse hoje que a insegurança constante e o conflito armado no Afeganistão estão contribuindo para piorar os já baixos níveis de apoio ao governo e ao desenvolvimento, e para aumentar os altos níveis do constante deslocamento da população. Centenas de milhares de afegãos foram deslocados nas províncias do sul e do sudeste do país, e milhões continuam como refugiados no Irã e no Paquistão, relutantes em regressar ao Afeganistão, especialmente para as áreas rurais, devido à falta de segurança e assistência ao desenvolvimento.

“Muitos afegãos já estão lutando para sobreviver”, disse Mariner. “Os crescentes ataques insurgentes contra civis, especialmente trabalhadores governamentais e de ajuda humanitária, estão piorando a situação.”

A Human Rights Watch apelou ao Talibã, ao Hezb-e Islami e a grupos associados para que cessem todos os ataques intencionais contra civis e alvos civis, e evitem todos os ataques que não façam distinção entre civis e combatentes ou que causem dano desproporcional a civis. A Human Rights Watch também apelou aos insurgentes a se abstenham de usar ataques pérfidos e parem com todos os atos destinados a instigar terror entre a população civil.

A Human Rights Watch também apelou ao governo do Paquistão para que tome medidas mais eficazes contra as forças insurgentes que estão localizadas além da fronteira, e que usam o território paquistanês para preparar ou planejar ataques que violam as leis de guerra.

Finalmente, a Human Rights Watch apelou às forças afegãs e internacionais para que criem melhores regras de combate para minimizar o número de mortes de civis durante as hostilidades, por exemplo, localizando instalações militares a distâncias maiores das áreas civis, evitando mandar comboios por áreas com muitas pessoas sempre que possível, e melhorando o modo como as forças respondem a ataques reais ou percebidos para evitar atacar civis equivocadamente.

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