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Angola: Repressão Violenta dos Críticos

Aumento da Violência e Ameaças Suscita Preocupações Relativamente às Eleições de 2012

(Joanesburgo) – O governo angolano deve pôr imediatamente termo ao uso da força desnecessária contra manifestantes antigovernamentais pacíficos, defensores dos direitos humanos, jornalistas e políticos da oposição, anunciou hoje a Human Rights Watch.Garantir à população o exercício dos direitos fundamentais à liberdade de associação, expressão e reunião pacífica e mover ações judiciais contra quem viola estes direitos é crucial para a criação de um ambiente pacífico para as eleições legislativas previstas em 2012, afirmou a Human Rights Watch.A 4 de abril, Angola vai celebrar 10 anos de paz desde o fim da guerra civil que assolou o país durante décadas.

Desde janeiro de 2012, as autoridades angolanas baniram e reprimiram cinco manifestações contra o governo e detiveram pelo menos 46 manifestantes, 11 dos quais foram condenados a penas de prisão de até 90 dias pelos tribunais. Parece tratar-se de uma tentativa do governo para pôr um travão ao novo movimento de protestos promovidos por grupos de jovens e outros indivíduos desde março de 2011, afirmou a Human Rights Watch. A Human Rights Watch também manifestou a sua preocupação com o facto de os meios de comunicação estatais parecerem estar a promover grupos anónimos que incitam à violência contra os manifestantes antigovernamentais.

“A crescente violência contra manifestantes, observadores e políticos da oposição indica um contexto de direitos humanos em deterioração antes das eleições legislativas”, afirmou Leslie Lefkow, diretora-adjunta de África da Human Rights Watch. “O governo angolano deve adotar medidas urgentes para pôr termo a esta repressão dos protestos e do ativismo pacífico”.

Polícias fardados que, aparentemente, estavam a atuar em colaboração com polícias armados e vestidos à civil e com outros agentes de segurança, atacaram violentamente manifestantes antigovernamentais na capital, Luanda, a 27 de janeiro, 3 de fevereiro e 10 de março. Em Benguela, a 10 de março, a polícia deteve arbitrariamente um líder da manifestação, um defensor dos direitos humanos e um espectador, e, a 17 de março, a polícia impediu a realização de mais uma manifestação. Em Cabinda, a 4 de fevereiro, a polícia atacou violentamente trabalhadores da saúde em greve.

Agentes da polícia fardados e à civil, e indivíduos que se crê estarem ligados ao governo, têm atuado de forma cada vez mais violenta e com total impunidade durante manifestações pacíficas, denunciou a Human Rights Watch. A polícia não interveio para proteger os manifestantes e políticos da oposição que estavam a ser violentamente atacados por indivíduos armados, que pareciam estar a atuar em coordenação com ou sob a alçada da polícia.

Recentemente, o Ministro do Interior, Sebastião Martins, negou qualquer envolvimento das forças policiais na violência. Na noite seguinte à repressão de 10 de março, a televisão estatal transmitiu ameaças de grupos anónimos que declararam agir em defesa da paz contra os manifestantes antigovernamentais.

As investigações sobre os incidentes violentos anunciadas pelas autoridades não resultaram na instauração de qualquer processo contra os responsáveis pelos ataques, que foram identificados pelos manifestantes e por testemunhas oculares. Foram também denunciados novos ataques, ameaças e casos de assédio de natureza política cometidos contra manifestantes e observadores.

A 10 de março, grupos de jovens convocaram manifestações no bairro de Cazenga em Luanda e na cidade de Benguela em protesto contra a nomeação pelo Conselho Superior da Magistratura, em janeiro, de Suzana Inglês para o cargo de presidente da Comissão Nacional Eleitoral. Os partidos da oposição argumentam que o perfil da nova presidente não cumpre os requisitos legais do cargo e que, enquanto membro da Organização da Mulher Angolana (OMA), organização do partido no poder, falta-lhe imparcialidade. Alguns partidos da oposição tinham decidido aderir aos protestos.

Nos dias que antecederam as manifestações de 10 de março, grupos de indivíduos desconhecidos assediaram, intimidaram e agrediram vários líderes dos protestos em Luanda. Na tarde de 9 de março, uma dúzia de indivíduos que envergavam óculos de sol e chapéus forçou a entrada em casa de Dionísio Casimiro “Carbono”, músico de rap e um dos líderes dos protestos, tendo-o agredido a si e a outros jovens manifestantes, ferindo três deles. A 7 de março, seis indivíduos em vários carros raptaram, agrediram e feriram dois organizadores dos protestos, Mário Domingos e "Kebamba", que estavam a caminho do local da manifestação prevista no Cazenga. As vítimas apresentaram queixa junto da polícia.

Em Benguela e Luanda, dias antes das manifestações planeadas, circularam panfletos da alegada autoria de grupos juvenis desconhecidos que declaravam agir em defesa da paz. Os panfletos urgiam a população a não aderir aos protestos, que alegavam pretender criar instabilidade no país.

Na manhã de 10 de março, em Cazenga, uma dúzia de polícias vestidos à civil, que usavam óculos de sol e chapéus e estavam armados com porretes de madeira e metal, facas e pistolas, atacou um grupo de 40 manifestantes e uma série de espectadores, tendo ferido um dos líderes dos protestos, Luaty Beirão “Mata Frakus”, bem como dois outros manifestantes. Três jornalistas que cobriam o evento – um da Voz da América, outro da Rádio Despertar e um jornalista freelancer – e os manifestantes procuraram refúgio em residências privadas nas proximidades para escaparem à violência.

Testemunhas contaram à Human Rights Watch que os agentes da polícia abandonaram o local à chegada dos indivíduos armados e vestidos à civil, e não intervieram contra as agressões cometidas pelos segundos, apesar dos pedidos de ajuda (que lhes dirigiram). Enquanto fugiam, os jornalistas e os manifestantes ouviram disparos de tiros atrás de si.

Nessa tarde, indivíduos desconhecidos atacaram e feriram gravemente Filomeno Vieira Lopes, dirigente do partido da oposição Bloco Democrático, e Ermelinda Freitas, a secretária municipal do partido, no centro da cidade de Luanda. Estavam ambos à espera de um colega que se voluntariara para resgatar jornalistas e manifestantes feridos em Cazenga. Ermelinda Freitas disse à Human Rights Watch que dois agentes da polícia estavam presentes durante os ataques mas não intervieram, tendo ignorado os pedidos de ajuda que as vítimas e transeuntes lhes dirigiram.

Nessa noite, a televisão estatal, Televisão Pública de Angola (TPA), transmitiu durante o horário nobre um telefonema de um indivíduo desconhecido que alegava falar em nome de um grupo de cidadãos que reivindica a responsabilidade pela repressão. Negando qualquer ligação à polícia e às autoridades, o autor da chamada ameaçou voltar a “reagir com determinação” contra qualquer manifestação antigovernamental. A televisão estatal não transmitiu, em momento algum, qualquer declaração dos manifestantes, partidos da oposição ou das organizações da sociedade civil que condenaram publicamente a repressão violenta.

Na manhã de 10 de março, em Benguela, a polícia destacou unidades de intervenção rápida, brigadas caninas e carros de jato de água por toda a cidade. Polícias fardados e à civil, armados com pistolas, dispersaram um grupo de cerca de 60 manifestantes pacíficos e detiveram três homens: Hugo Kalumba, um dos líderes da manifestação, Jesse Lufendo, ativista da organização de direitos humanos Omunga, que estava a tirar fotografias, e um motorista de táxi que estava a assistir aos acontecimentos.

A 16 de março, um tribunal em Benguela condenou os três homens a 45 dias de prisão por desobediência e agressão de agentes da polícia, apesar de não haver quaisquer provas contra os mesmos. Em tribunal, os organizadores apresentaram provas de que tinham informado as autoridades sobre a manifestação com antecedência, de acordo com os requisitos legais, e tinham solicitado proteção policial. Disseram que as autoridades responderam apenas verbalmente, dois dias antes da manifestação planeada, tendo banido os protestos sob o pretexto de que o local inicialmente previsto se situava a menos de 100 metros de distância da sede de um partido político. Posteriormente, os homens detidos foram libertados sob caução.

No dia seguinte, as autoridades baniram mais uma manifestação em Benguela convocada pela Omunga, invocando o direito à reunião pacífica, sob o pretexto de que a organização não tinha concluído o registo legal. Face ao envio em massa de forças policiais no dia 17 de março, a organização cancelou a manifestação.

Desde então, o assédio, a intimidação e a violência cometida contra os participantes e apoiantes, ou outros indivíduos considerados simpatizantes dos protestos, têm continuado.

Num segundo ataque sofrido por Ermelinda Freitas, a secretária municipal do Bloco Democrático, sete pessoas, uma das quais de cara tapada, forçaram a entrada em sua casa a 23 de março. Ameaçaram-na a si e à sua família, e roubaram computadores, pen drives, máquinas fotográficas e documentos pessoais.

A 21 de março, Coque Mukuta, jornalista da estação privada Rádio Despertar, encontrou um panfleto na sua residência de Cazenga da alegada autoria de um “movimento juvenil organizado para defender a paz”. A Human Rights Watch viu o panfleto, que continha uma nota escrita à mão endereçada pessoalmente ao jornalista: “É melhor mudares de bairro. Cuida-te, bandido. Tu não tens medo. Cuida-te”.

No início do ano, a polícia reprimiu violentamente uma greve em Cabinda e duas manifestações em Cacuaco, um bairro na periferia de Luanda.

A 4 de fevereiro, a polícia deteve 21 grevistas do sindicato dos trabalhadores da saúde na cidade de Cabinda, incluindo dois dirigentes do sindicato. Os trabalhadores da saúde tinham entrado em greve em toda a província no dia 30 de janeiro para fazerem pressão pela melhoria das condições de trabalho e pelo pagamento de subsídios em atraso. A polícia enviou a unidade de intervenção rápida, carro de jato de água e brigadas caninas, dispersou e atacou violentamente os grevistas em frente à sede do sindicato, à qual tinham recolhido após terem sido forçados a abandonar a frente do hospital. Foram libertados no mesmo dia sem terem sido formalmente acusados. Um dirigente do sindicato disse à Human Rights Watch que, no mesmo dia, a polícia também deteve temporariamente e maltratou uma enfermeira em greve em Buco Zau, uma cidade no interior de Cabinda.

A 27 de janeiro, a polícia dispersou uma manifestação de residentes de Cacuaco, que exigiam água e eletricidade, e deteve 12 manifestantes. A 31 de janeiro, um tribunal condenou oito dos detidos a 90 dias de prisão e ao pagamento de multas, e absolveu os restantes. Os manifestantes detidos foram posteriormente libertados mediante o pagamento de uma caução de 400 dólares.

A 3 de fevereiro, a polícia de ordem pública e de intervenção rápida, armada com armas automáticas militares, dispersou um grupo de cerca de 50 jovens, residentes locais e familiares dos manifestantes detidos que pediam a sua libertação em Cacuaco. Um dos organizadores da manifestação disse à Human Rights Watch que uma dúzia de polícias à civil e armados com pistolas agrediu violentamente os participantes. A polícia deteve 10 manifestantes, mas libertou-os no mesmo dia sem acusação. Os organizadores disseram que tinham informado as autoridades sobre a manifestação com antecedência, mas que não receberem qualquer resposta.

A Human Rights Watch já tinha denunciado extensivamente o uso desnecessário ou excessivo de força por parte da polícia contra manifestações antigovernamentais, bem como ameaças, intimidação e detenções arbitrárias de jornalistas e ativistas políticos pela polícia e outros agentes de segurança em Angola ao longo do último ano, incluindo a repressão de uma manifestação contra o governo a 5 de dezembro de 2011em Luanda.

Vários manifestantes envolvidos nos protestos que se têm vindo a realizar desde março de 2011 contaram à Human Rights Watch que foram vítimas de intimidação, receberam telefonemas anónimos com ameaças dirigidas aos próprios e às respetivas famílias, e foram seguidos por indivíduos de carro. Alguns contaram-nos que apresentaram queixa, mas ainda não conseguiram obter qualquer tipo de informação da polícia sobre se foi aberta alguma investigação.

“O governo de Angola deve respeitar os direitos fundamentais dos indivíduos à reunião pacífica e à liberdade de expressão, em vez de punir os críticos e a oposição política”, declarou Lefkow. “As ações repressivas do governo não auguram umas eleições legislativas pacíficas”.

 

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